terça-feira, 25 de agosto de 2009

"A gente é educado pra não roubar, mas não é educado pra não ser roubado"

Olá, pessoal!

Comentei com um amigo que esse mês bati meu recorde: assisti três filmes brasileiros no cinema em menos de 30 dias! Isso, para mim, é um feito incrível, tanto pela falta de promoção do cinema nacional, quanto pela ausência de cinemas que deem-no espaço. E devo dizer que valeu à pena!

Deixando de enrolar, o post vai falar de um desses filmes. "Se nada mais der certo" é uma obra-prima brasileira que não se vê há algum tempo. E para comentar à altura essa película, temos uma presença especial aqui, meu grande amigo Vinícius Monteiro, o Vinnie.

Atualmente, ele se encontra no quarto período da graduação de cinema e é um apixonado pelo que faz. Portanto, ninguém melhor do que ele para fazer uma análise.

No entanto, seu texto é bem técnico, então, se não entenderem algo, é só perguntar que, com todo prazer, ele responderá pra vocês.

Sem mais delongas, vamos à crítica.


O filme conta a história de um jornalista ferrado que mora com uma viciada em drogas e o filho dela. Sem dinheiro nem para pagar a luz, ele e dois novos amigos, uma figura andrógena e um taxista devastado pelo suicídio do pai, se unem para praticar delitos cada vez mais perigosos. A obra retrata muito bem os jovens que são “órfãos de Estado”, que lutam diariamente para sobreviver num sistema falho, quase inexistente. O resultado é a anarquia dos injustiçados. A narração de Léo, em off, e os títulos dos capítulos conduzem as questões propostas pelo filme. “A gente é educado pra não roubar, mas não é educado pra não ser roubado.”; “O trabalho danifica o homem”, “A lógica do formigueiro”, “Não se meta com meus inimigos”. Esses elementos, juntos com imagens em super 8, planos sem nenhuma relação com a estória e uma trilha sonora inusitada quebram a narratividade, dando ao filme um tom abstrato e descontínuo, assim como as vidas desses jovens.

Belmonte se apóia em câmeras tremidas e numa fotografia estourada e suja para mostrar o caos e a corrupção de uma megalópole. O filme é constituído por muitos planos fechados e big closes, que conseguem transmitir a sensação de claustrofobia que os personagens sofrem, por estarem presos a uma sociedade regida pela hipocrisia.

O trabalho sonoro de “Se nada mais der certo” é uma obra à parte. O som do filme nem sempre condiz com a imagem, gerando uma nova significação a tudo. Ruídos e músicas inesperadas em momentos inesperados. “Os saltimbancos”, musical infantil adaptado para o português por Chico Buarque, está presente em grandes momentos do filme, adicionando uma ironia ácida à estória. O silêncio também é muito bem aproveitado por Belmonte que, apesar do humor ‘tarantinesco’ presente em algumas cenas, faz um trabalho muito minucioso na direção de atores, tornando os personagens tão fortes que transbordam na tela.

A montagem do filme é baseada em elipses temporais, muito parecidas com as de Godard, e no choque entre planos, característica do cinema construtivista russo, que, através de imagens ‘opostas’ cria-se um contraste, gerando uma significação maior. O filme é todo composto de cortes na narrativa, cartelas, offs, músicas, imagens aceleradas e etc.. Isso aproxima o filme de Belmonte do cinema-novo, onde o mais importante não era contar uma estória, mas gerar questionamentos sobre o tema, através da trama e de como ela é contada. Por isso a cena de sexo entre ‘Léo’ e ‘Marcin’ é mostrada em poucos closes, pois o objetivo não é mostrar o ato sexual, mas o encontro de duas pessoas perdidas no meio de tanta desordem.

A direção de arte se faz presente até no vazio dos cenários. Conseguimos perceber muito bem a diferença sócio-cultural entre os personagem, mesmo eles estando na mesma condição financeira, seja pelo figurino ou pelos objetos de cena. Os personagens e seus mundos se mostram concretos e verossímeis. Mérito também das ótimas atuações, em especial da atriz Caroline Abras (‘Marcin’) que, com sua personagem, se torna o centro das atenções e o pivô de todos os acontecimentos.

Aqui vai o link do trailer do filme: http://www.youtube.com/watch?v=mHPU9YivQJY

Recomendo a todos!

Encerro por hoje agradecendo novamente ao meu amigo Vinícius. Obrigado, Vinnie, pelo texto! Ficou excelente!

Abraço,

Rodrigo, MtF.

2 comentários:

  1. Cinema brasileira dando um passo de cada vez, o trailer é fantástico, e a história parece retratar com bastante fidelidade um sistema falho e pueril.

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  2. E claro, no dia da estréia, to lá... rs

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